Por Clay Susini
Aquino Junior, PMP
Um equívoco comum cometido pelos Escritórios de
Gerenciamento de Projetos é conceber um Programa como Projeto ou vice e versa.
Em um primeiro momento esse tema parece soar sem
importância, como se fosse apenas mais uma definição teórica e puramente conceitual,
mas é a base para o fracasso real de inúmeros Projetos.
No Brasil e, principalmente, no setor corporativo privado,
Projetos são erroneamente definidos como Programas apenas por serem grandes.
Mas o tamanho é simplesmente a consequência, e não o motivo para um Programa
existir.
Outras justificativas usadas para transformar conjuntos de
Projetos em Programa são o aproveitamento da dinâmica comum de vários recursos
e a existência de inúmeras frentes de trabalho com mais de um time. Realmente
Programas possuem essas características, mas apenas como consequência de um
fator maior: a concepção de uma idéia geradora de um benefício estratégico,
dando origem a um conjunto de iniciativas independentes responsáveis por
concretizar o benefício idealizado.
Um Programa, antes de se tornar um conjunto de projetos,
nasce como uma idéia estratégica geradora de um benefício singular, sem a real
certeza de que virá a se tornar dois, cinco ou dezenas de Projetos
independentes. No momento de concepção do Programa, não sabemos ao certo o que
deve ser feito para atingir o benefício idealizado, tampouco como fazer.
Sabemos apenas que uma série de tarefas independentes gerará um benefício
estratégico e único. E é comum um Programa, em plena execução, ainda gerar
novos Projetos com o intuito de consolidar o benefício estratégico definido
anteriormente.
Por sua vez, Projeto é um esforço pontual, menos abstrato.
Por mais que um Projeto em sua fase de iniciação possua indefinição de escopo,
tempo e custo, sempre temos em mente a principal entrega. Sabemos o “o que”.
Apenas não sabemos ainda o “como”. E nesse contexto, para diferenciar um
Projeto de um Programa, não importa o tempo, o custo e nem a quantidade ou
interação entre os recursos.
Parafraseando o PMBoK (Project Management Body of
Knowledge), do PMI (Project Management Institute), Projeto é um empreendimento
temporário, com recursos limitados, que gera um resultado, produto ou serviço
único. Já Programa é um conjunto de Projetos independentes que estão unidos e
associados estrategicamente para geração de um benefício. Em um Programa,
obviamente cada projeto possui um benefício próprio, afinal são independentes.
Mas o benefício gerado pelo Programa é diferente dos benefícios individuais de
cada Projeto. E esse benefício do Programa é geralmente pensado primeiramente e
estrategicamente antes de ser criado o conjunto de Projetos.
Como exemplo, podemos citar o Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) do Governo Federal. O Programa possui como objetivo construir
infraestrutura logística e energética para sustentar o crescimento do País. O
objetivo de um Programa sempre terá a característica de ser abstrato, pois na
concepção da idéia só há a expectativa do benefício e não do objeto entrega.
Não sabemos exatamente o que terá que ser feito para que o benefício seja
obtido, tampouco como.
O Governo Federal dividiu o PAC em seis Subprogramas e duas
Frentes de Trabalho. Os Subprogramas do PAC são: PAC Energia, PAC Habitação,
PAC Cidade Melhor, PAC Comunidade Cidadã, PAC Água e Luz Para Todos e PAC
Transportes.
Cada um desses Subprogramas possui vários Projetos. Por
exemplo, o Subprograma Cidade Melhor possui o Projeto Construção Estação de
Tratamento de Esgoto na Baixada Santista, o Projeto de Construção de Drenagem
Urbana na Baixada Fluminense, entre outros. E há também os Projetos internos do
Programa que não são expostos à população, como Projetos de marketing para
promover o Programa em rádio, TV e Internet, Projetos de Desenvolvimento de
Sistemas de Informação do Governo etc.
Outra característica dos Programas é a existência das
Frentes de Trabalho. Em tradução livre do The Standard for Program Management
do PMI, Programas incluem elementos de trabalho não contidos em nenhum de seus
Projetos. Esses elementos são as Frentes de Trabalho, que atravessam os
Projetos, não necessariamente todos, apoiando a integração necessária para o
benefício único do Programa. Como exemplo, a auditoria interna poderia ser uma
Frente de Trabalho do PAC. As ações de auditoria atravessariam os Projetos
gerando o benefício de integridade do Programa como um todo. Mas oficialmente o
PAC possui duas Frentes de Trabalho: Medidas Institucionais e econômicas e a
outra é Desenvolvimento Econômico Social.
A construção de uma usina hidrelétrica, por exemplo, se
idealizada unitariamente, é um Projeto. Mesmo que demore 10 anos para ser
construída e mobilize bilhões de reais, continuaria sendo um Projeto, e não um
Programa, pois o que foi idealizado é o produto de forma direta.
Essa usina poderia estar dentro do Programa de Aceleração do
Crescimento, e seria completamente normal caso a usina não tivesse sido
idealizada no momento da concepção do Programa, pois se pensou no benefício da
Aceleração do Crescimento no Brasil, e não em todas as entregas palpáveis que
concretizariam esse benefício.
Programas geralmente possuem fases futuras totalmente
abstratas em escopo, tempo e custo, muito mais abstratas que as fases futuras
de um Projeto. De maneira rotineira, Programas são subdivididos em fases ou
subprogramas. A primeira fase constantemente possui projetos visualizados com
mais clareza ou já em execução. E a as demais com a visualização apenas da
percepção do benefício desejado.
Após toda essa exposição conceitual, ainda perdura a dúvida:
qual o problema em confundir Projeto com Programa ou vice e versa?
Conceber e executar um Projeto como Programa não é tão
grave, mas certamente criará na corporação uma imagem errada do que é Programa
e a sensação de que gerenciar Programa é o mesmo que gerenciar Projeto. E caso
a corporação comece a implementar o conceito de Programa, terá dificuldade em
difundir o conceito correto.
Porém, será catastrófico executar um Projeto quando na
verdade for um Programa. O “Projeto” sofrerá aumento de escopo e prazo
constantemente e a corporação não entenderá o motivo, mas ocorre que o peso de
uma idéia estratégica, que é abstrata, foi delineado para ser entregue em um
único “Projeto”, que possui um molde pontual e bem mais objetivo que a fase
inicial de um Programa. O titulado “Projeto” nesse caso, terá inúmeras fases e
mais cedo ou mais tarde essas serão tão independentes uma das outras que
possuirão entregas totalmente diferentes, autossuficientes e com objetivos
próprios. Novas entregas começarão a ser criadas no decorrer do ciclo de vida e
não serão bem aceitos pela corporação, pois serão concebidas como se fossem
incrementos de escopo (scope creep) e causadoras de atraso, quando na verdade
são novos Projetos, independentes, e que apenas agora se visualizou a
necessidade estratégica de criá-los e assim solidificar cada vez mais a
expectativa abstrata inicial. Essa sucessão de desastres costuma ocorrer quando
se faz a gestão de um Projeto sendo na verdade um Programa.
Texto publicado na e-News do PMI São Paulo de dezembro de
2011
Sobre o autor: Clay Susini Aquino Junior é Gerente de Programas e Projetos da
BM&FBOVESPA, certificado Project Management Professional (PMP), MBA em
Gerenciamento de Projetos pela Fundação Getúlio Vargas, Bacharel em Sistemas de
Informação com Ênfase em Planejamento Estratégico pela Universidade
Presbiteriana Mackenzie, membro do PMI (Project Management Institute) e do
IFPUG (International Function Point Users Group).
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